segunda-feira, 24 de março de 2014

ÚLTIMO CREDO - Augusto dos Anjos


Como ama o homem adúltero o adultério
E o ébrio a garrafa tóxica de rum,
Amo o coveiro — este ladrão comum
Que arrasta a gente para o cemitério!

É o transcendentalíssimo mistério!
É o nous, é o pneuma, é o ego sum qui sum,
É a morte, é esse danado número Um
Que matou Cristo e que matou Tibério!

Creio, como o filósofo mais crente,
Na generalidade decrescente
Com que a substância cósmica evolui...

Creio, perante a evolução imensa,
Que o homem universal de amanhã vença
O homem particular que eu ontem fui


Esse é um dos mais belos poemas de Augusto dos Anjos! Poema cheio de humanismo, o coveiro é a personificação da morte, a principal musa do poeta paraibano: muito mais do que a cor da pele, a raça e a língua, a morte é a única coisa que une a todos os homens, é a única coisa que nos faz todos iguais. Este poema é uma alusão a esse momento tão sombrio e, ao mesmo tempo, tão humano. É a morte que nos faz universais, o homem universal de amanhã que vencerá o homem particular e subjetivo de hoje. "o homem universal de amanhã vença O homem particular que eu ontem fui". O homem que se faz singular neste momento tem um encontro inevitável com o homem universal de amanhã!